sexta-feira, 21 de abril de 2017

2ºs: Filme ALEXANDRIA AGORA (2º BIMESTRE)


Passando-se em Alexandria, entre os anos 355 e 415 da nossa era, o filme “Alexandria” (no Brasil) ou “Agora” tem como personagem central a filósofa, matemática e astrônoma Hipátia (ou Hipácia). Filha de Theon (ou Teão), último diretor conhecido da Biblioteca de Alexandria, Hipátia teve uma atuação destacada em sua área, figurando em domínios considerados masculinos e trabalhando como professora. Passou para a História como tendo sido uma mulher muito bonita e o filme segue essa ideia, estrelando a bela atriz Rachel Weisz no seu papel. Apesar de despertar paixões em alguns de seus alunos, Hipátia recusava qualquer proposta de casamento ou de envolvimento amoroso. Sua energia parecia ser toda voltada aos seus estudos e questões matemáticas e astronômicas, embora a realidade religiosa e social de sua época tenha se atravessado em seu caminho.
Única personagem feminina do filme, Hipátia dá aulas de filosofia, matemática e astronomia na escola nascida ao lado da famosa biblioteca criada por Alexandre Magno – O Grande. Seu pai, Theon, é o diretor da academia e o mentor da filósofa.
A cultura disseminada em Alexandria nessa época se deu à partir da combinação de fatos que  vão desde a estruturação da Biblioteca que acolheu quase todo conhecimento até então produzido ao mesmo tempo que atraiu os principais estudiosos da época juntamente com  alunos ávidos por novas descobertas transformando a cidade egípcia em um grande centro de estudos acadêmicos.
Após a conquista de Alexandria pelos Romanos, a cidade passa por constantes agitações provenientes de diversas orientações religiosas: a tradição dos judeus e do politeísmo helênico-romano se encontra com a efervescência do cristianismo, que passou de religião intolerada para intolerante, após a institucionalização da religião Cristã pelo Império Romano.
Dentre os alunos de Hipátia, destacam-se Orestes, que a ama sem ser correspondido, e Sinésio, adepto do cristianismo. Há também o escravo Davus, que ama, secretamente, a filósofa. Entretanto, Hipátia não deseja se casar, mas se dedicar à Ciência e à Filosofia. O filme retrata sua paixão pelo estudo e sua incansável procura por respostas sobre o movimento da terra em torno do sol.
Em uma época de conflitos sobre a fé, ficam evidentes os vários enfrentamentos entre cristãos, judeus e a cultura greco-romana. Aos poucos os cristãos se apoderam da situação e passam a provocar conflitos entre os cidadãos.
Orestes se torna prefeito de Alexandria permanecendo fiel ao seu amor por Hipátia, com quem mantém constantes discussões filosóficas. O escravo Davus, que teve sua liberdade concedida por Hipátia, se debate entre a fé cristã e a paixão por sua antiga proprietária. O líder cristão Cirilo passa a dominar a cidade, mobilizando ordas de monges que atuam como protetores do dogmatismo católico do início do cristianismo. Estes encontram na ligação entre Orestes e Hipátia o ponto de fragilidade do poder romano, iniciando uma campanha de enfraquecimento da influência de Hipátia sobre o prefeito, usando as escrituras sagradas para acusá-la de ateísmo e de comportamento inadequado para uma mulher. O filme mostra os conflitos que se seguiram entre os que professavam a nova religião cristã,  o judaísmo e o politeísmo Greco-romano.
O momento histórico do filme remonta ao período em que o cristianismo deixava de ser uma religião perseguida para se tornar uma religião perseguidora. A Biblioteca de Alexandria funcionava junto a um templo pagão conhecido como Serapeum, dedicado aos deus Serápis, uma divindade egípcia que era uma fusão dos deuses Ápis e Osíris. O cristianismo, que recebera liberdade de culto alguns anos antes, aumentava cada vez mais seu número de fiéis, entrando em choque com a religião e cultura pagã. Esses conflitos levaram à destruição do Serapeum e da Biblioteca que ali existia. Alguns anos mais tarde, o alvo passou a ser a própria Hipátia, que representava a cultura pagã e ainda por cima era uma mulher e exercia certa influencia na política local, o que era inadmissível aos líderes cristãos da época. Aparentemente, o filme chegou a enfrentar algumas críticas e dificuldades de distribuição por conta da polêmica envolvendo a imagem dos cristãos e da religião em geral, o que talvez explique sua ausência nos cinemas brasileiros.
Aquele foi um momento em que os cristãos agiram como bárbaros e desprezo pela cultura. Em termos religiosos estavam numa fase de exclusivismo (não queriam liberdade de culto, queriam que o seu culto fosse o único admitido), sobrepondo a filiação religiosa à estrutura política da comunidade. Tudo isso é histórico e é oportuno lembrar, neste tempo em que muitos cristãos ocidentais acusam outras religiões dessas práticas.
Polêmicas à parte, o filme é uma rara oportunidade de ver uma reconstituição do que poderia ter sido a Biblioteca de Alexandria. Não existem muitas certezas em relação à famosa Biblioteca, a maior da Antiguidade.  Acredita-se que funcionava junto a Academia (ou Museu) de Alexandria, mas não há unanimidade quanto a sua localização física, se ela ocupava um edifício à parte ou se era um conjunto de estantes nas dependências do próprio Museu. Posteriormente, teria surgido outra biblioteca, localizada junto ao Serapeum e que seria a que aparece no filme intitulado “Agora” em inglês e “Alexandria” no Brasil.
O templo de Serápis, divindade greco-romana derivada do contexto helenístico, representava a intensificação da cultura grega no interior do Egito após a conquista deste território por Alexandre Magno. Serápis está relacionado com Júpiter, representado com forma humana, tendo sobre sua cabeça um vaso, que lhe serve como coroa, aludindo à fartura e fertilidade.
As origens da Biblioteca remontariam ao período de Ramsés II(1285 a.C.), mas até hoje historiadores e arqueólogos debatem sobre a existência desse prédio nunca encontrado que teria guardado uma coleção real de pergaminhos. Com a conquista do Egito por Alexandre em 332 a.C. e a fundação de Alexandria, ali se somaria aos rolos da coleção real existente para a formação de uma biblioteca, onde todo pergaminho que existisse em seus domínios deveria ter uma cópia ali guardada, representando uma gigantesca concentração de saberes de diferentes épocas e lugares, um tesouro de inestimável valor.
Na transição do Império para o Cristianismo, a Biblioteca foi vítima de um ataque em virtude da associação direta de sua existência com as crenças pagãs e assim, foi em nome da fé que o bispo Teófilo de Alexandria ordenou a sua destruição, junto dos ídolos e altares dos deuses, que a partir de 391 d.C., tornaram-se ilegais, dando lugar aos altares dos templos cristãos.
Mas esse não foi o único nem o primeiro incêndio, foram vários, mas a carência de fontes somada à controvérsia das fontes remanescentes gerou uma grande confusão: Júlio César chegou atacar o Egito antes de se envolver com Cleópatra VII e colocá-la no trono e alguns relatos mencionam a destruição de alguns milhares de rolos de uma “coleção de livros”, que é o significado de Biblioteca, mas não significa que se tratava do mesmo acervo guardado no Serapeum.
Dessa forma, observamos de outro ângulo as destruições e recomposições do acervo da Biblioteca, desfazendo aquela visão equivocada que apresentava a invasão árabe como a responsável pela destruição integral da Biblioteca. Houve sim um incêndio causado pelo califa Omar em 640 d. C. durante a conquista do Egito pelos árabes.
Alexandria foi um dos mais importantes centros culturais da cultura ocidental por mais de um milênio, reunindo pensadores, letrados e discípulos que vieram de diferentes partes para ali estudar e dali levar cultura às suas terras de origem. E dessa forma, a destruição desse acervo levou a uma perda irreparável do conhecimento existente no mundo antigo, restando a nossa época uma pequena fração daquilo que existira no passado.
O filme Alexandria acabou construindo uma dupla imagem entre a Biblioteca e a personagem central Hipátia, que pouco a pouco, viu seu espaço desaparecer em virtude da crescente influência política que os cristãos passaram a ter, especialmente com a ascensão de Cirilo (Samy Samir) como bispo de Alexandria, logo após a morte de Teófilo, o qual incitou seus fiéis à perseguição aos judeus e depois dos pagãos e na sequência, aos cristãos insubmissos como o caso de Orestes, que mesmo sendo prefeito da cidade, o símbolo do poder imperial, viu seu prestígio ser ameaçado, tendo que inclusive escolher entre o cumprimento estrito da fé cristã e sua relação com Hipátia, sendo que este último dado, não existem tantas informações para saber se assim fora, mas muito provavelmente, se coloca dentro da licença poética do diretor para a construção da narrativa do filme.
Sobre Hipátia, as lacunas são gigantescas: não restaram nenhum de seus trabalhos e aquilo que lhe atribuem é resultado de menções de outros autores, mas a frequência e quantidade de informações que aparecem nessas diferentes citações nos sublinha a sua importância.
Seu reconhecimento foi aparecendo de diferentes maneiras: o pintor Rafael Sanzio em seu afresco Escola de Atenas a incluiu entre os grandes sábios, sendo a única mulher ali presente, colocando-a em pé, vestindo branco e numa posição de destaque, ao observarmos a imagem, na região esquerda, não muito longe de Averróis (seu nome original era Ibn Roshd, tradutor e comentador árabe de Aristóteles) que aparece de turbante, usando verde e Alexandre Magno, conforme podemos observar abaixo.
Já nos textos literários, de autores como o filósofo francês Voltaire e historiador inglês Edward Gibbon no século XVIII não deixaram de esquecê-la, ao destacar seu papel dentro do pensamento neoplatônico, além dos conhecimentos ligados à matemática e astronomia, aliás, valendo-se dela como um contraponto ao fanatismo religioso que se disseminou na época de Hipátia e depois se manifestou em muitos outros momentos ao longo dos séculos, infelizmente.
Apesar de estarmos numa época tão diferente da ambientada pelo filme, o discurso radical e intolerante não desapareceu e ainda se faz vivo, querendo usar argumentos nobres para mais uma vez, calar, censurar e até exterminar tudo aquilo que é tido por “diferente”, que dentro desta lógica se torna sinônimo de “perigoso” e por isso deveria ser proibido ou destruído, segundo os delírios radicalizantes da intolerância, fato que sempre representam uma grave perda para a Humanidade.


Direção: Alejandro Amenábar
Roteiro: Alejandro Amenábar, Mateo Gil
Produção: Álvaro Augustín, Fernando Bovaira
Fotografia: Xavi Giménez
Trilha Sonora: Dario Marianelli
Duração: 127 min.
Ano: 2009
País: Espanha
Cor: Colorido
Distribuidora: Flashstar Home Vídeo
Estúdio: Canal+ España / Cinebiss / Himenóptero / Mod Producciones / Telecinco / Telecinco Cinema
Fontes:
http://www.historiadigital.org/filmes/filme-agora-de-2009/ (adaptado)
http://omundodasnuvens.wordpress.com/2011/03/08/agora-e-a-biblioteca-de-alexandria/ (adaptado)
http://maquinaespeculativa.blogspot.com.br/2009/12/agora-o-filme-hipacia-de-alexandria.html (adaptado)
http://mostrasemira.blogspot.com.br/2012/03/filosofa-grega-e-retratada-no-filme.html (adaptado)
http://gabinetedehistoria.blogspot.com.br/2011/08/resenha-do-filme-alexandria-agora-de.html (adaptado)

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